10 outubro, 2011

Recomendação

"(...)o meu corpo está profundamente ligado ao da minha mulher.Possuo,de facto,dois corpos,e a minha vida é dupla.Embora pareça não ter cerebro, como uma cobaia,o meu corpo permanece apaixonado pelo corpo da minha mulher.A minha necessidade de intimidade com quem vivo vai muito mais além da vida sexual


.Uns amedrontam-se da vida de casal exactamente pela perspectiva de ver o outro nas mais sórdidas situações.Mas o meu amor nutre-se precisamente por isso.Aprecio ir às compras com ela,tomar café,olhá.la na banheira,tagarelamos sobre ovnis.Gosto de olhá-la como come,e como estende a roupa.


Quando fazemos amor, a nossa intimidade é algo muito preciosa e o nosso prazer depende dela totalmente.Na realidade,fazem amor dois corpos que se conhecem infinitamente,mas que nunca se saturam em redescobrir-se.Sei o que fará em cada instante,embora sempre me surpreenda.Quanto melhor conheço a sua pele,os tendões,a cútis,os gestos,as palavras,maior e mais desesperada é a minha curiosidade


.A minha intimidade com o meu outro corpo é permanente;quando durmo,sei,em sonhos,que está junto a mim,mas no momento do amor físico a intimidade torna-se total.Então aí,já não distingo o olhar do tacto,a ternura da violência,a felicidade do sofrimento.Quero-a somente para mim,pois só eu a conheço.Olho-a,entre as coxas "borboletas sonolentas com asas coladas",e sei que,na realidade,é a coisa mais bela que alguma vez possa ter visto e alcançado.

A nossa intimidade,em casa,na nossa cama,não nos extenua,antes porém nos frutifica a alegria erótica.Para ela,tudo se torna erótico,e tudo,por muito frustrante ou atrevido que seja,está protegido da vulgaridade.Apenas em tal espaço protegido,o teu corpo,assim como a tua mente,podem abrir-se á exploração do outro.(...9 Na verdade,só atinges a maturidade sexual quando começas a viver um estranho solipsismo a dois que te faz afirmar : em todo o universo não existem senão dois seres que verdadeiramente fazem amor : eu e a minha amada."

in, Porque gostamos das mulheres do escritor romeno Mircea Cartarescu


Ao leitor,se como eu gosta de sentar-se num puff no canto dum quarto,e abstrair-se de tudo o resto,e ler ao som de musicas que nos levam para um outro mundo,leia o livro como eu o li ao som de Mojave 3, e este conto ao som de "love songs on the radio".


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