23 maio, 2011

Raquel


Lembro me que em criança costumava adorar escadas rolantes. Sim, a coisa mais entusiasmante para mim num centro comercial eram sem dúvida as escadas rolantes. Porém agora desço as aqui, este dia, a esta hora de uma manhã comum, num normal dia da semana, e a minha vontade é passar à frente da Sra que carrega uma mala qualquer dum trabalho. De repente passam por mim jovens eléctricos, não lhes basta o movimento da passadeira, eles ainda correm por elas abaixo.
Ainda o dia agora começou e já carrego um grande peso sobre mim. Olho para mim aqui a divagar sobre nada, e ainda nem estou no trabalho…emprego, nem acredito que tenho uma coisa dessas. É estranho ser adulta, e ter de carregar o meu mundo e o dos outros nos ombros.
Que saudade tremenda dos tempos universitários! Na altura queixava-me! Devia andar doida! Claro que como tudo na vida, não deixei de ter as minhas pedras no caminho, mas nada se compara com o agora. Se a miúda de 15 anos que existe em mim me pudesse ver, ela estaria radiante “um curso tirado, solteira, independente, apartamento próprio, decoração da melhor, cama enorme, janelas largas,” se a essa miúda me visse dar-me-ia os parabéns.
Só que essa miúda, era simplesmente isso, uma simples e vulgar miúda de 15 anos que vivia utopicamente e sonhava mudar o mundo. São já 8:20,acho que vou chegar atrasada já ao tal emprego. O melhor é imitar aquelas miúdas dos seus 18 anos de mão dada com os seus miúdos de 22,e descer também as escadas rolantes.
Engraçado o que uma pessoa retém na memória, lembro-me de tanta coisa da infância, memorias que parecem uns simples flashes mais nada, e que parecem tudo para mim, e de coisas recentes nunca me lembro.
Tenho saudades da juventude de outrora, de andar por aí de mãos dadas com o meu miúdo de 22,daquelas simples noitadas com os amigos, de ver amanhecer o dia na praia, cheios de felicidade próprias da adolescência, o não ter de se preocupar com contas para pagar, o sorrir para o rapaz do lado sem complexos, e de como aquela universitária, seguir com um sorriso estampado na cara e usar jeans e sapatilhas e ser feliz só pelo entrelaçar das mãos. (Oh God! A vida era tão mais cómoda quando usava jeans e sapatilhas.)
Faltam 5 minutos para o próximo metro chegar. Sento me num banco ao lado de outras pessoas e observo os rostos de cada um.
Ao meu lado duas senhoras, na casa dos seus 70,mal vestidas, cara cansada, gordinhas, cheiro a peixe, recordavam com saudades os seus tempos de meninice e queixavam-se da vida actual.
Do outro lado da estação uma criança chata berrava a todos os pulmões, batendo energicamente na perna da mãe que o tentava ignorar.
Na verdade, aquele casal foi uma lufada de ar fresco naquele submundo de toupeiras humanas, estão todos com ar de gente deprimida. Nem quero imaginar a vida deles! E eu admito, estou cada vez mais egoísta e invejosa, e por isso mais triste, solitária, fria e distante com as pessoas que realmente amo.
O metro chega então, e as pessoas atropelam-se entre as saídas de umas e a entrada de outras.
Saí do metro no Marquês e subi aquelas tremendas escadas. São cerca de 3 pisos até vermos a luz do dia, que


hoje, nem sequer existia. O Porto é mesmo assim, tem mais nuvens que sol e um nevoeiro matinal que amo mas é por isso mesmo que adoro a cidade.
Chego ao meu estúdio de arquitectura e não sei se é dos meus olhos ou então simplesmente porque acordei mal disposta, mas aquilo está uma completa bagunça. A rapariga também está atrasada “5 minutos Sra Raquel, hoje o trânsito está terrível ”, recebo numa curta sms.
 -Apanhasses o metro - penso em voz alta.
Ultimamente tenho pensado muito em voz alta, ando nas ruas e dou por mim a falar sozinha. Sim! É sinal de loucura, e quem passar por mim, pensará que sou uma demente.
  


in,Anjos do Norte,Joana Almeida

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