Ela ia ali todos os dias.Sempre de manha.Entrava e pedia sempre a mesma coisa "um pastel de nata e um galão".Ficava de pé.perto da janela,vendo as gentes passarem,enquanto o fumo do leite quente se espelhava pelo ar e embaciava a janela.Folheava o jornal, não lendo nada porém.Era loira,de pele branca clara envelhecida,e abusava na maquilhagem.Pintava os lábios e as unhas de encarnado,usava uma blusa multicor,tons azulados,da cor dos olhos.
Nunca a ninguém a vi acompanhada.Sempre sozinha,sempre...
Entre uma mordida no pastel e um gole no galão,lá voavam meio que às escondidas umas pílulas rosas.
Falava sozinha,rindo-se de si mesma,seguida de silêncios.
O leite nem a meio ia,e todos a olhavam,rindo-se dela,apontando friamente,os mais novos sobretudo.
"olha a velha","endoideceu", e ela berrava-lhes,gesticulando,levantando os braços.
Ignoravam-na,e ela olhava para o vidro,e como uma criança,com o dedo,desenhava imagens no vidro embaciado,porque um dia,até nem muito distante,todos voltamos à meninice....
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